"Casamento com festa e presentes enche os armários da casa nova. Eu sempre gostei de dar taças e cálices para os noivos. Nem costumo o-lhar aquelas listas que ficam nas lojas - taças, eu quero taças. Que um casamento se inicie com um armário cheio delas. Noivos que não pedem cálices e taças não estão casando para ser felizes, e eu tive prova disso num casamento para o qual fui convidada alguns anos atrás: na lista, só havia panelas, pratos, eletrodomésticos e jogos americanos. Muita vida real para qualquer começo; assim, dei um jogo de taças. Não adiantou muito: alguns meses depois o casal se separou, e as taças devem ter ido parar num quarto-e-sala de solteiro. Mas o fato é que a vida precisa de brindes... Creio que no fundo desses delicados bojos cristalinos habita um eterno convite à alegria: o começo de uma vida nova merece comemoração, e toda vida que se perpetua também pede o seu tintim, mesmo que ele seja simbólico. Com o passar do tempo, no entanto, as taças vão desaparecendo; um belo dia, a gente abre o armário de louças e se dá conta de que aquelas taças que a vovó nos deu já não existem mais, e fazer um inventário dessas perdas é uma aventura interessante. Um brinde de Natal, e pum!, uma taça vai se embora. Aquela noite romântica e um arroubo na semi-escuridão da sala: mais um gol. Uma antiga festa de aniversário, e a sua melhor amiga erra a linha divisória entre o fim da mesa e o começo do caminho que leva ao chão. Assim vão sumindo os cálices e as taças da vida da gente. Mas vão ficando os momentos. Ontem à tarde, por exemplo, comecei a arrumar a mesa para um chá de fraldas aqui em casa e vi que meu armário estava bastante desfalcado - não foi difícil nem triste lembrar como meus cálices foram partindo, um por um... Foi bom. E gostei dos conjuntos desfeitos, da mesa com as taças diferentes, onde tantas vezes confraternizamos com amigos queridos, brindando filhos, empregos novos, aniversários e reencontros. Depois, durante a festa, mais uma das minhas taças se foi. Uma taça de cristal polonês que morreu com elegância derrubada pelo babado do vestido de bolinhas de uma loira menina de três anos. Rimos todos, porque a pequena Camila sequer se assustou com o sucedido, e adorou quando alguém lhe contou que taças quebradas traziam sorte. Essa, no caso, vai nos trazer mais do que sorte. Vai nos trazer a querida Ana - que hoje, enquanto escrevo, ainda não nasceu, mas que pode estar no colo da sua mãe quando este texto for publicado, sob os olhares atentos da irmãzinha Camila. Por enquanto, seguimos esperando a sua chegada. Mas no armário de louças aqui de casa, o espaço que sobra já é uma alegria a mais. "
leticia.wierz@zerohora.com.br
leticia.wierz@zerohora.com.br
No comments:
Post a Comment